Eu-lírico do Blog

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São Carlos, SP, Brazil
Tenho um coração mais mole que sagu e muitos cachinhos que contam histórias. Do resto, sou metida, fresca e vivo no mundo da lua. Fim.

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

O círculo e o amigo

Para Davi esse presente bem pequeno que é pra caber na mala e no peito.

Presa ao meu saudosismo e a algumas roupas,
permiti que o sol inundasse a minha casa como inundam-me seus abraços.
Vinte anos, de repente, reduziram-se a tão pouco.
Como eu poderia enclausurar o universo em minha gaveta
quando você mesmo diz, meu amigo, es muss sein?

Nos olhos ainda trago as estrelas que vimos juntos.
Aquelas estrelas exageradamente surreais deglutidas por meras lentes telescópicas.
Mas não eram necessárias lentes nem uma noite limpa nem mesmo estrelas.
Nós podíamos vê-las, querido,
e podíamos senti-las... E amá-las! Amá-las como Werther.

Um canto, ainda que mudo, sempre te embalará.
– Um bando de loucos vaga em meio as ruas cantarolando cantarolando e cantarolando através da noite –
ainda me dirão.
E em meu rosto desabrochará o mais terno sorriso, estarei me recordando de você
que diz – Esqueça a rotina como Mccandless –,
que transforma alegrias em canção.

Faça como Alice fez. Esse mundo é deveras pequeno pra você.
Assim como esse saudosismo, eu confesso,
que ainda hoje me banhou e já se mostra deveras vasto em meu coração.
Vá, viaje
sem rumo, sem destino.
Siga Cassady, Kerouac e quem mais você quiser.

Só peço-lhe que volte, assim como Édipo voltou.
Mas ao invés de tragédias, peço-lhe que traga toda sorte de alegrias junto aos seus cacarecos.
Algumas pra mim, outras para o restante da sua eterna Tebas.
As demais, sei bem,
virarão canções.

sábado, 31 de março de 2012

A casa no final da estrada

Eu me senti tão viva ao atravessar as portas do Le Club Chasse et Peche. Foi quando te vi. Você não conseguia tirar os olhos de mim, por isso eu não me surpreendi quando me perguntou se nos conhecíamos. Bem, o que eu posso dizer? Agora que você está fora de mim pode ver toda a beleza. Pode se arrepender pelos seus pecados.

Há uma coisa que eu gostaria de dizer... Você... Bem, eu quero dizer que... Errr... Você... Bem... Você... Você foi o que eu queria.
Eu sinto muito.

Sim, eu acho que a gente já se encontrou antes - você respondeu sorrindo. Quando suas palavras ecoaram meu ouvido, eu vibrei. Deus, como foi estranho te ver de novo, apresentada por um amigo de um amigo.

Viva através disso e você não vai olhar pra trás...
Viva através disso e você não vai olhar pra trás...
Viva através disso e você não vai olhar pra trás...
Eu repetia pra mim. Desacreditada. Ferida. Fraca.

Essa cicatriz é uma mancha em minha pele de porcelana, você tentou me alcançar profundamente, mas não conseguiu. Então é isso. Não é nada além de tempo e um rosto que você vai perder. Um rosto que vai se desprender de um nome. Eu escolhi sentir isso. Você não pôde escolher.

Eu lhe escreverei um cartão. Mandarei notícias. Eu... Pro... Prometo.

Apesar da chuva, pegamos um táxi na Rue St-Claude. Passamos por toda a Pont Champlain em silêncio. Foi engraçado descobrir que você estava tão perto... Que era a mulher da casa no final da estrada. Mas acho que você pensou que eu estava triste. Apenas estava tentando lembrar seu nome.

Eu lhe escreverei um cartão. Mandarei notícias da casa no final da estrada, do amor verdadeiro. Bom, ainda tenho uma coisa a dizer, serei breve... Você foi o que eu queria. Eu dei o que eu dei... Eu não me arrependo de ter te conhecido. Eu não me arrependo de ter chegado ao fim. Eu não me arrependo de não ter mais nada pra dizer. Eu não me arrependo de não ter mais nada para ser salvo.

Meu nome é Thomas, foi um prazer.
- O prazer foi todo meu... Sou Louise.

sábado, 2 de julho de 2011

Um ano reduzido à cócegas e lágrimas

De repente, quando Clara sentiu cócegas no olhar, tomou pela mão aquela antiga foto. E antes que a primeira lágrima pudesse despencar, já não entendia, afinal, o que fazia ali. Há um ano, pensava... E de novo começavam as tais cócegas no olhar. Tudo havia mudado, ela sabia, mas não entendia. O que era aquela dor? De onde vinha? Por que vinha? Clara nada mais sabia. Ou nunca soube. E as cócegas insistiam em continuar.
Clara se lembrava de um dia, de um sorriso, de uma promessa, então, as cócegas se tornavam um incêndio em seu olhar. Eu pensei que... Buscava ela inutilmente uma explicação para o quanto havia se enganado. Essas coisas são tão normais, pensava ela. Mas isso é realmente normal? A mentira é algo comum? Clara ficava encafifada com toda aquela situação e eram nesses momentos que as cócegas pareciam ter ido embora. E tinham ido. 
Então, quando Clara se lembrou daquele rosto, daquele abraço, lá estavam elas novamente, as malditas cócegas no olhar. Eu posso fugir, eu posso esquecer, dizia Clara para si. Mas podia? Ela podia fugir de tudo, fisicamente podia. Só não sabia o que fazer com as lembranças, com aquele sorriso, aquele rosto, aquele abraço, aquela promessa... Assim, de repente, as cócegas faziam com que Clara sentisse suas lágrimas pulando, uma a uma, pra longe dos seus olhos. Eram tantas, que já nem sabia pra onde iam. De certo se perderiam em algum lugar, secariam, evaporariam, sei lá, pensava Clara. 
Em antítese, Clara abriu um sorriso. Um largo e sincero sorriso. As cócegas cessaram. As lágrimas se secaram nos próprios olhinhos miúdos de Clara. Essas lágrimas são mágicas, pensou ela consigo. São tristeza, são alegria, é tanta coisa em uma só. Mas ninguém parece ligar. Quando essas cócegas, malditas cócegas, infestam nosso olhar, queremos que as lágrimas venham, queremos que elas apaguem esse incêndio. Queremos que elas afoguem nossa dor. Elas vêm, fazem o que tem que fazer, chegam a nos confortar. Mas significam tão pouco pra nós. Assim como um sorriso, um abraço, uma promessa pode significar tão pouco pra uns. Podem significar tão pouco que, aquele sorriso sincero, aquele abraço sincero, aquela promessa sincera que fez alguém mais feliz, talvez fossem apenas gestos sem sentido. Talvez fossem apenas mentira. E as cócegas voltaram e afogaram o pensamento de Clara. 
Espero que um dia as cócegas venham, assim, acompanhadas por um sorriso, um abraço, uma promessa... Tão sinceros, que as palavras jamais poderiam descrever tamanha felicidade que causariam. Espero precisar das lágrimas, pensava.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Angústia ou Um telefonema ou Três Tombos ou Livro e Chá

Já se passava da meia noite. Suzana não tinha em vista o telefone. Tudo o que lhe restava era um livro recheado de histórias tristes, uma xícara de chá e aquela angústia que tilintava em seu peito. Sabe-se lá que angústia. Angústia de que? Angústia de onde? 
Suzana não queria mais saber daquele livro. Nem do chá. Nem da angústia. Então, Suzana tentava se concentrar na tevê, embora não enxergasse nada ali. Eram apenas imagens aleatórias, inúteis. Imagens quase que transparentes tentando esconder a tal angústia. Mas não adiantava. A angústia era tudo o que Suzana via. E que angústia. E o telefone? Era preciso apenas um telefonema. Um alô. Uma palavra. Um sinal. A verdade é que nada daquilo era preciso. Mas era o que pensava Suzana enquanto procurava o telefone. E que procura.
A tevê chama a atenção de Suzana. “Modelo tomba na passarela”. Modelos tombam na passarela? Suzana precisa terminar seu chá. Seu livro. E a angústia? Como terminar com ela? Qual o problema em tombar? Um tombo. Dois tombos. Três. O telefone. Acho que não devo ligar. Mas é só uma ligação. E pronto. É só uma angustiazinha. E vai virar uma angustiazona. É melhor não ligar. Vou esquecer. É só tomar um chá. Ler um livro. Um, dois, três tombos. Quem liga? Todos tombam na vida. Não é só modelo não. É isso. A vida é uma passarela. 
E assim prossegue Suzana, cruzando a interminável noite. Já não lhe importava o chá. Nem o livro. Nem o telefone. Só lhe importava a angústia. É só um tombo. Afinal. Quem liga?

sábado, 14 de maio de 2011

A Gata Borralheira do século XXI

Era uma vez a história que não precisava necessariamente ter um final feliz. Embora tenhamos uma donzela que, segundo os estereótipos femininos, espera seu príncipe encantado montado em um cavalo branco, aqui nem tudo se resolve com um passe de mágica.
Nessa história, Cinderela sofre desilusões amorosas, neuroses e até TPM. Uma TPM daquelas, que nem fada madrinha pode resolver. A única solução plausível seria nossa mocinha se entupir de chocolate ou espantar o mau humor após meio litro de vodka barata. Melhor ainda se ela estiver com cólica, depois de um porre e algumas gotinhas de Buscopan, a dor e o mau humor vão direto para o espaço.
Quando a vida da nossa Cinderela está quase no eixo – pois anda sempre pendendo de um lado para o outro – sem ajuda de fada madrinha nem nada, nossa heroína vai em busca do mais lindo vestido. E, claro, andando pelo shopping, acaba encontrando um lindo par de sapatinhos de cristal que se encaixam perfeitamente em seus pés. Depois de aproveitar uma liquidação ou outra, Cinderela está pronta para ir ao encontro do seu príncipe encantado. E é a partir daí, que a história muda de cenário.
Ao final do período de provas de Cinderela e, finalmente, quando ela também recebe férias de sua patroa – ou madrasta -, ela tem bastante tempo para suspirar e se ocupar com as lembranças de um príncipe que nem cavalo tem. A Gata Borralheira do século XXI terá sorte se for convidada para o grande baile e puder dançar com o homem dos seus sonhos.
Mas não vamos ser pessimistas. Entre tantas decepções e fracassos, a mocinha da história é convida para o baile. E, sem abóbora ou ratos encantados, ela consegue chegar ao seu destino. Com o mais belo look da festa e a mais caprichada maquiagem, é claro que nossa Cinderela moderna desperta a atenção do seu “príncipe encantado”.
Eles dançam.
Eles se olham.
Eles suspiram.
Eles se beijam.
Eles se abraçam.
Ele faz as mais sinceras promessas de amor.
Ela? Se apaixona.
Agora, quer saber a maior semelhança entre a personagem principal dessa história e a Gata Borralheira que conhecemos ainda na infância? É simples.
Para ambas, a festa sempre tem hora pra acabar.

terça-feira, 3 de maio de 2011

O melhor de Tati

A história completa de Ritinha
Tati Bernardi

Ritinha fingiu a vida inteira mas nunca deixou de procurar a verdade. Sempre uma tosse de angústia na boca do peito. Sempre um motorzinho acelerado enjoado lá pro meio de algo que fica dentro. O olho ardia. A língua travava de vontade de mudar todo o discurso pronto e dizer apenas a verdade. Mas qual era a verdade? Então seguia fingindo. A vida inteira. Estudou um monte de coisa que se embaralhava na sua frente, mas fingia acreditar que aquilo a levaria para algum lugar. Um lugar com novos amigos e novos amores, talvez. Talvez essa fosse a verdade que purificaria tanta coisa sem sentido. Mas também não era isso porque, com esses amigos e amores, Ritinha seguia fingindo. De fingir estudar passou em tudo que fingiu se importar. De fingir curtir as festas e os amigos e aquilo tudo, Ritinha vivia em álbuns felizes e acabava feliz. De fingir amar, acabou chorando e doendo e escrevendo tantas coisas bonitas. Ritinha seguia fingindo o tempo todo. Às vezes, com medo de morrer soterrada por tanto teatro, Ritinha segurava firme no fundo dos olhos de alguém e dizia: a verdade é que, a verdade é que. E a pessoa, caso fosse assim como Ritinha, uma pessoa especial (porque quem procura essa verdade sempre é) só dizia: eu sei, eu sei. E era isso. Um momento especial, de verdade, sem a bola de pêlo presa na goela. Sem a tosse de angústia, tentando soltar algo pro ar entrar. Mas que algo? Mas que tosse? Então Ritinha ia ao psiquiatra e dizia não entender todas essas coisas como nuvens e casamentos e rodas fedorentas de caminhões bafando quente e infernal e abajures e cartões fidelidade e apostilas e tudo isso que acaba acontecendo porque acontece com todo mundo. Mas pra quem? Por quê? Qual é a verdade? Todos caminhando, todos com horários, todos de volta, cansados, o cérebro já bem gasto, agora podemos dormir, ufa, podemos dormir, pra quê? Pra amanhã mais e mais. E Ritinha ia. Como na hora do rush do metrô. Empurrada pela multidão sem verdade pra dentro de algo que leva pra algo. Pra onde? Eles precisam pagar as contas, eles precisam pagar o plano de saúde, diria sua mãe. Tá, e daí? Ter um problema sério nos ocupa de não ter o problema real. O problema real é que não dá pra calar a cabeça procurando a verdade. Que verdade? Quem inventou as nuvens? Porque as rodas de caminhões soltando fumaças quentes lembram tanto o inferno? E quem disse que a roda solta alguma coisa? Onde está a saída daqui? O tempo todo essa pergunta: onde está a saída daqui? Qual o caminho mais rápido para a minha cama, o silêncio, o escuro. Ritinha abraça as pernas, como criança, e se diz baixinho: não dá pra saber a verdade, não dá pra parar a cabeça, nada parece realmente o que é, hoje eu não disse o que realmente queria, aquelas pessoas não sentem aquilo que demonstram, eu pouco me importo com 70% dos preenchimentos do meu dia, mas é preciso chegar até amanhã. É preciso chegar. Ritinha se formou, trabalhou, namorou, viajou, casou, teve filhos, escolheu vestidos, escolheu pisos, escolheu tacos, escolheu flores, escolheu travesseiros, escolheu máquinas de lavar, escolheu o nome do neto, escolheu fazer a cirurgia, escolheu o sapato baixo, escolheu ver a novela ao invés do filme, escolheu dormir até mais tarde no dia que a empregada chegava mais cedo. Sem saber a verdade, Ritinha escolheu viver. No último segundo, até porque prometi que essa era a história completa de Ritinha, Ritinha descobriu algo que nunca mais poderá contar a ninguém. Só o que sabemos é que, em sua última sugestão do que seria a verdade, ela sorriu como sorrimos para um bebê quando ele se levanta bem compenetrado depois de desabar.

domingo, 20 de março de 2011

É assim que vou escrevendo...

Às vezes, quando eu fico triste, me vem uma vontade louca de ser artista. Pego o violão pelo braço, faço e me desfaço dos acordes - alguns, que nem nome tem - e começo a transformar a tristeza em canção. Mesmo que seja uma canção "esboçada" e de melodia desafinada. Sei que é inútil, mas esse é um exercício de quem quer se desvendar, de quem tem algo pra encontrar. Chaga uma hora que paro e penso: mas-o-que-é-que-eu-tô-fazendo? e quem disse que eu sei responder?
É por isso que às vezes eu saio por aí escrevendo. É como se as palavras me dissessem: Vem, eu lhe digo quem é você. Mas dizem?
Infelizmente, quando eu terminar esse texto, mal terei a certeza do porquê o escrevi. Minhas dúvidas continuarão vivas dentro de mim e, de certo modo, me sentirei um pouco feliz. Querendo ou não, são elas que impulsionam minha vida, meu ser.
Quem sabe um novo texto? Quem sabe...